sábado, 28 de maio de 2011

Expectativas do amor: o dia em que realmente me casei

Estávamos conversando no gtalk e Heloisa insistia para que fôssemos passar o feriado no apartamento dela em Niterói. Talvez o feriado e mais dois dias, um mês, o tempo que fosse necessário: vou ficar no Catete, nos meus pais, alguém precisa ficar um pouco lá, vocês precisam!

me: ai, Helô é foda, cê salvando vidas o que quer em troca, afinal? pra que, afinal?12:40 AM Heloisa: também pensei nisso, mas não sei muito bem pro meu apartamento não ficar sozinho12:41 AM pra vocês trocarem a lâmpada do banheiro (é muito forte) (falei que o microondas tá quebrado? não se animem) pra vocês não terem que ficar num ambiente ruim sem saber a que veio o relacionamento de vocês
4 meses atrás, Rafael tinha chegado de Londrina, mudava-se definitivamente pro Rio trazendo uma barba imensa na cara, poucas coisas na mala, basicamente nada nos bolsos: o dinheiro da venda de sua biblioteca de teologia que, imaginava, daria pra viver por algum tempo. Uns dias antes, meu irmão mais velho tinha sido diagnosticado com tuberculose. Me lembro de estar parada na Praça Tiradentes em frangalhos porque precisava voltar pra casa e pegar uns documentos que faltavam pra concorrer ao mestrado em História da UFRJ, concurso que eu não tinha a menor esperança de passar e onde eu nem sabia exatamente porque tava me metendo. Rafael me ligou: Pri, sua mãe pediu pra desmontarmos o beliche porque seu irmão está saindo do hospital. Ela comprou uma cama nova e precisa de espaço pra montá-la.
- Mas onde nós vamos dormir, meu deus??

Claro, minha mãe estava fragilizada pela doença do meu irmão; ele sempre inspirou tantos cuidados, sempre, sempre... mas, se ele ficaria isolado no quarto onde antes dormíamos os três (eu, ele e Rafa), pronde a gente ia?
Passamos a dormir na sala em dois colchões. A sala fica no andar de baixo; a casa da minha mãe é um sobrado pequeno e insalubre. Eles têm mania de trancar tudo, o lugar é úmido e as paredes rescindem a infelicidade. Me entristecia de ter colocado ele ali no meio daquilo tudo e agora duma doença, mas a gente tinha uns planos que deram errado e agora eramos os primeiros a acordar, os últimos a dormir - porque as pessoas precisavam ver a novela e o filme até tarde. Namorávamos clandestinamente, silenciosos, ainda ríamos dos esconderijos, das gambiarras e como pela manhã afastávamos os dois colchões de solteiro: só estamos dormindo perto, não dormindo juntos! Meus pais não são burros, o de ninguém é, mas certas regras se seguem.
Mas então dias, viravam horas e semanas, as forças sumiam, as oportunidades de emprego também.

Heloisa foi e propôs que fôssemos pro apartamento de Niterói. Tinha cama, tinha tudo. Peguei lençóis, panelas e toalhas que tinha comprado numa liquidação da Casa&Video. Entulhamos roupas, coisinhas, pacotes de miojo, livros e o que dava em malas, sacolas, mochilas.
É nítida pra mim a imagem dos meus pais no sofá que era forrado de azul, e eles tavam que não iam chorar de jeito nenhum. Dissemos que era só um final de semana e ficou todo mundo em silêncio por algum tempo. Meu cachorro se coçou o depois deitou junto dos pés da minha mãe como se também já tivesse sacado tudo. Eu os abracei, Rafael deu um tradicional adeus com as mãos e eu disse tchau, mãe.
Foi assim o dia em que me casei.

No apartamento da Heloisa, era a primeira vez que íamos dormir numa cama de casal! Brigamos, brigamos terrivelmente, choramos muito e nos dissemos coisas muito ruins até que ficamos quebrados no chão junto da porta porque ninguém mais tinha forças. Mais um dia naquela casa e teríamos morrido, um dia e não saberíamos mais a que veio o nosso amor já começado.
Desculpem, é que não tem um modo certo de eu dizer isso, e sou péssima pra escrever sobre coisas que realmente aconteceram embora eu só escreva sobre dias de fato ocorridos. Essa é uma lembrança estranha - ela se revela - como se tivesse vindo de outra vida porque agora estou escrevendo no nosso escritório, na nossa casa (em São Gonçalo, mas é nossa) e em cima da nossa cabeça tem os nossos livros e preciso postar isso agora porque tem de fazer a janta, Rafael está chegando da tutoria que foi dar e eu inda muito enrolada com ai meu deus, meu vestido de noiva não parece muito babaca?
A gente resolveu casar quase que de sacanagem. Assim, a gente já tá casado, quem é que diz que não? Amigado na fé, casado é. Dois anos e qualquer coisa depois, a gente já passou por uma porrada de coisas, a gente já foi pedir emprego nas Lojas Americanas pra ganhar 500 reais, a gente já ficou sentado no terminal de ônibus no carnaval porque não tinha como voltar pra casa, eu já andei do Rio Sul ao Passeio porque faltou 20 centavos da passagem, a gente já viajou pela primeira vez de avião e passamos as férias no litoral catarinense, e eu já percebi que minha sogra não me curte. Também aprendi a cozinhar e fomos comprando móveis com o maior cuidado, pagamos uma fortuna numa lixeira linda só pra agregar dignidade a nossa casa vazia cujas contas vamos pagando com uma certa folga.

Esse é nosso mote, assim passamos os dias. Temos uma rotina de velhos e vamos tolerando as coisas erradas que fazemos um ao outro, conversamos, somos muito amigos, eu gosto do cheiro dele e gostamos de sentar no colchonete na frente da TV (porque ainda não temos sofá) pra assistir Star Wars pela vigésima vez. Eu não sei como é pras pessoas que esperam 2, 3, 4, 5 anos pra ter um emprego público, pra ter um vestido, um carro, um sapo-buquê. Eu não saberia esperar por isso, a gente é muito urgente, eu quero é ficar junto do meu pretinho o mais rápido possível, quero nem saber aonde. Com certeza isso não é o ideal. Ainda temos muitas incertezas financeiras, por exemplo, mas a verdade é que estamos bem e que não faria sentido esperar pra viver algo que já podemos viver porque há o impedimento-detalhe X ou Y. A gente foi e fez assim. Eu não sei como é pras outras pessoas e nem vejo sentido porque viver junto não é uma festa, nem é previsto, nem é estabelecido. Enfim... Não sei pra que que a gente se meteu nessa. Espero que sejamos felizes porque temos sido felizes, espero que possamos construir porque temos construído, e que haja uma visão das dificuldades que surgiram e surgem, e dos amores, e dos dias, e dos desejos. Que gente possa se conhecer, passar um monte de dias, ter um monte de filhos, se casar, ficar casado um monte de dias, seja o que Deus quiser e panz.

12 comentários:

Erika. C. disse...

Nossa! O que dizer?
Realmente deu um aperto no peito depois de reler isto. Mas foi um aperto bom, daqueles que sentimos ao ler um livro ou ver um filme sobre uma história de amor pouco açucarada, porém muuito intensa. Ah, tô falando bobagem, mas é como me sinto.
De qualquer modo, já te conhecia da comunidade do orkut "Casamentos Orçamentos" e chegamos a trocar idéias sobre mini weddings. Torço para que dê tudo certo todos os dias de seu casamento!
Ah! Tb curto o trabalho do Fábio prá cacete e vamos fechar com ele esta semana (se tudo der certo, espero).

Beijos!

Etiene Rocha disse...

Nossa mãe!
Eu comecei a ler esse seu post, sem pretensão de comentar.
Mas a vontade falou forte, na realidade gritou mais forte.
Menina que coragem, mas que coragem linda! Nossa mãe!
Acho que que casar é isso, porque o que vai valer o sapo-buquê se acabar o amor depois de 1 mês ou 1 ano. O importante é amar e isso vejo que vocês tem de sobra.

marimagno disse...

quero isso pra mim também.
adorei seu casamento e por isso vim no seu blog.
parabéns pela sinceridade e pelo amor que vêm tão natural.

um beijo.

Pitch_girl_jessie disse...

Nossa menina!Vi seu post no Casando sem grana e perdi o fôlego quando li isso aqui! que coisa linda*-* quero me casar com meu pretinho no ano que vem e espero que tudo seja tão real quanto foi com você.
Felicidades mil!

Amanda Medeiros disse...

tbm adorei o seu texto. como a moça acima, tbm vi o post do Casando sem grana, fiquei curiosa pq estou passando mais ou menos pela mesma coisa. decidi fazer uma festinha de casamento, com o meu namorido esse mês, nós tbm moramos juntos e temos mtas dessas dificuldades que vc citou. quase choro lendo tudo o que vc escreveu, nos vi, nas suas dificuldades... é bom saber que tudo dá certo mtas vezes. ;) Felicidades pra vcs!

Giselle Baeta disse...

Prill!

Da comu do orkut...dos seus relatos do casamento, das fotos com o Fábio Moro, da loucura do penteado. Me diz COMO eu nunca tinha lido isso aqui!

Confesso que de alguma forma me senti pequena, como posso achar q tenho os maiores problemas do mundo, como posso CRIAR problemas...

A história de vcs, bateu forte aqui em mim.
Tô lendo hj, 04/10, e deu td certo, né?

Obrigada por compartilhar e qnd eu "crescer quero ser igual a vc" rs

Bjs

Prill disse...

ô gente.... obrigada imensamente pelo carinho. só agora to aparecendo pra agradecer, me perdoem aí o mal jeito.

devo dizer a todas, e a Gi, quem comentou ontem/hoje: tá tudo bem agora!

seguimos na construção. shit can happen, o negócio é prosseguirmos ancorados, companheiros e amantes. é só o que desejo pra todos nós que resolvemos apostar muitas fichas malucas na vida a dois.

beijos infindos

Tats B. disse...

Cheguei aqui pelo Casando sem Grana, para inicio de conversa.

E vou fechar a aba do meu navegador com os olhos mareados.

Já saí de casa mais ou menos assim e sei o sentimento da ida, mas espero em breve saber o sentimento da chegada no ninho, com o pretinho do lado.

O amor é uma coisa tão bonita e tão incrível que a gente sente no amor dos outros o nosso mesmo.

Sejam felizes, é tudo que eu desejo.

Cristina disse...
Este comentário foi removido pelo autor.
VEJA O QUE ESTE BLUES QUER DIZER disse...

Você não devia fazer mestrado em história, mas em literatura !!.... adorei, estou casando em janeiro e vou morar junto este mês (setembro)... vou casar agora de verdade... choro todo dia de saudades do meu conforto de agora para os perrengues que virão depois, mas me sinto como você.... quero agora, de qq jeito. O amor vence tudo. Parabéns pelo texto.

Mulan disse...

Poxa, quase chorei. Além da linda história, você escreve bem pra c. Li hoje o post da noiva recessionista, através do CSG. Adoro diversos blogs de casamento, mas nunca vi alguém escrever tão bem sobre isso. Parabéns e que você continue cultivando esse amor e essa coragem.

Bia :) disse...

Ler isso no dia em que o banco liga pra dizer que o financiamento do nosso apê não foi aprovado... Destino?

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